Gotas de Amorosidade16/06/2020 3y4f66
Deus cuida de nós, dando-nos a potência do Amor!
Jesus nos diz repetidamente: “Não tenhais medo!”. E perguntamos a Ele: “Por que não?” A resposta está no Evangelho de Mateus: Porque podemos ter a certeza do cuidado amoroso do Deus da Vida! Com a imagem dos “pardais” e dos “cabelos”, Jesus testemunha que Seu Pai se importa com todas as pessoas. O amor de Deus é superabundante aos mais simples e vulneráveis que se sentem abalados como um singelo pardal ou insignificantes quanto um fio de cabelo que cai da cabeça, ao serem submergidos por poderes desumanizadores.
Neste cenário a resposta ainda não é satisfatória e continuamos a perguntar: “Qual é o valor do cuidado de Deus para nós?” Mesmo sob o cuidado divino, os pardais continuam morrendo e os nossos cabelos seguem caindo. Portanto, o cuidado de Deus por nós deve ser compreendido como algo diferente da proteção externa. O Deus de Jesus de Nazaré não nos tira da miséria, da peste, da doença, do esgotamento, do perigo, da calamidade ou da perseguição. Como então Deus se importa conosco?
Espontaneamente, dedicamos muita energia à preocupação com o nosso “corpo”, ou seja, para vários eventos importantes e externas: nossas roupas, nossa casa, nosso carro, nossa profissão, nossas férias, entre outros. Isto aparenta necessário para ser um sujeito autônomo decente e ter uma “vida boa”. E ninguém negará esta afirmação, pois ela faz parte do inconsciente coletivo. Não obstante, Jesus nos lembra que, além destes fatos externos, temos um núcleo humano, uma “alma”, o qual tem um valor incalculável e precede em importância todos os desejos forjados por nosso ego. Precisamente porque Deus habita o cerne divino da nossa alma, eclodindo um elo amoroso através da relação do “Eu e Tu”, a simbiose entre o Imanente e o Transcendente. A Divindade manifesta-se na Humanidade, fomentando o real sentido da Vida, a forma como amadurecemos no sentir o Outro, a Natureza, o Deus, e o Eu ao ser “eu sou eu e a minha circunstância” nesta Intimidade Divina, no convívio com Ele.
O cuidado amoroso de Deus por nós não afeta diretamente as circunstâncias materiais externas, mas reverbera um domínio muito mais profundo em nós. Deus trabalha no interior do mundo, no âmago do nosso ser, na inspiração do nosso coração, na nossa livre escolha, na nossa “alma”. Deus confere à nossa alma a dadiva do Seu amor. Assim, somos bem-aventurados, com a graça e a amorosidade Divina, ao experienciar as situações que advirem em nosso espaço vital. Logo, sempre recebemos a oportunidade de externar a virtude do amor em todas as nossas atividades.
Ao assumir a amabilidade de Deus em nossa existência significa que, independentemente do que acontecer conosco, poderemos optar por não reagir amargamente, de forma insensível ou odiosa, mas agradecidamente, perdoando, compartilhando e doando de maneira amorosa os dons inerentes ao nosso ser. Desta forma, o cuidado de Deus manifesta-se em nós, não como uma garantia que protegeria nossos valores externos e nos manteria livres de contratempos materiais. Todavia, como inspiração, como potência animadora, convidando-nos a nos entusiasmar em uma aliança pela Vida, pela Integralidade da Vida, no Continuar o Amor do Redentor mesmo em realidades de extremo sofrimento, porque “a Vida diz sim à Vida”.
Tomemos o exemplo de uma pessoa enferma, a qual está presa ao seu leito, doente. O cuidado amoroso de Deus por essa pessoa não significa que Ele a curará repentinamente, no entanto, inspirará os médicos, as enfermeiras, os demais profissionais de saúde e a família a prestar os melhores cuidados a este ser humano. E neste diálogo amoroso, o enfermo nutrirá uma consciência agradecida pelo Dom da Vida, mesmo nesse quadro de grande dificuldade, relacionará amorosamente com as pessoas que o cuidam.
Existem doentes que não reclamam, tanto quanto poderíamos esperar, ao vivenciar o sofrimento severo. Esta postura interpela as pessoas que o circundam, sensibilizando-as pela serenidade, humanidade e fé com que aquele ser humano, muito vulnerável em função da debilidade do seu corpo, assume a sua finitude. Na verdade, o Evangelho nos diz: “Não tenhais medo! Porque você tem o poder de amar, mesmo agora, em face a situação de extremo sofrimento!” Não importa o quão limitada esteja a nossa vida, por mais fragilizada que seja a nossa aparência externa, não importa o quanto somos falíveis, absolutamente ninguém poderá nos privar da possibilidade que temos, no cerne divino da nossa alma, de escolher não nos tornarmos amargos ou ressentidos neste momento singular da nossa finitude. Contudo em meio as diferentes dificuldades permanecermos gratos, contemplando a memória agradecida da nossa peregrinação existencial.
À guisa de conclusão, a relação proativa com a finitude é a grandeza por excelência do ser humano. Esta atitude amorosa não nos resgatará magicamente da miséria externa, mas nos dará uma verdadeira potência interior para conviver com os acontecimentos mais dolorosos da nossa Vida, ressignificando-nos ao reconhecer a vastidão do horizonte existencial ou refletir profundamente os sinais amorosos da Redenção em nossa biografia. Quando Deus vem em nosso auxílio, nunca é para fazer o trabalho em nosso lugar. Faz-se necessário o nosso comprometimento nesta “Relação Mistagógica”, para que cooperemos através das possibilidades que temos com o Seu cuidado, diário e amoroso por nós. Deus nos oferece o Seu Amor e a sensibilidade para amar, mesmo que nos sintamos tão imprestáveis quanto um pardal de rua ou um cabelo caído da cabeça. Não tenhamos medo, não tenhamos medo do Deus da Vida, nem do que poderá acontecer conosco neste mundo. Deus não salvará o pequeno pardal das intempéries da vida, da longa seca ou dos inimigos perigosos. No entanto, porque somos seres humanos, Ele concederá para nós, pequenos “pardais humanos”, a Potência de Amar.
Autor: Pe. Ricardo Geraldo de Carvalho, C.Ss.R.
Missionário Redentorista